Brasil vai bem nas exportações de carne bovina, mas ‘sonha’ com Japão e Coreia do Sul como destinos. Especialistas apontam que estes países asiáticos, por serem bastante exigentes, seriam mais do que compradores em volume, mas ‘cartões de visita’ pela aprovação da qualidade da proteína brasileira.
segundo dados da Associação Brasileira de Frigoríficos (ABRAFRIGO). Neste início de 2024, o montante exportado em toneladas em janeiro também cresceu em relação ao mesmo mês de 2023, na ordem de 28%. Entretanto, a receita pelas vendas internacionais da proteína brasileira vem registrando queda desde o ano passado, resultado de uma redução nos preços pagos pelos principais países importadores, principalmente a China.
Segundo dados da plataforma ComexVis do Ministério da Indústria, Comércio Exterior e Serviços, a China representou em 2023 60% do faturamento brasileiro com as vendas de carne bovina, seguido do Chile, com 5,1% e Estados Unidos, com 4,9%.
De acordo com Paulo Mustefaga, presidente executivo da ABRAFRIGO, nos últimos anos o Brasil se consagrou como um dos grandes exportadores de carne bovina, acessando importantes mercados como Estados Unidos, Canadá, México e Rússia. “O que ainda falta seria alguns mercados asiáticos importantes, como Coreia do Sul, que já existe uma negociação, e o Japão, que hoje é o terceiro mercado mais importante do mundo, atrás de China e Estados Unidos”, afirma.
O mercado da Coreia do Sul, um dos mais exigentes, só aceita importações de carne bovina e suína de locais que sejam livres de febre aftosa sem vacinação. Entre os dias 9 e 14 de novembro de 2023, uma delegação sul coreana visitou propriedades e plantas frigoríficas nos três Estados da região Sul do Brasil, conforme agenda organizada pelo Ministério da Agricultura e Pecuária (MAPA).
“No último dia de trabalho, eles conheceram o Laboratório Federal de Defesa Agropecuária, localizado no Rio Grande do Sul. Os dois estados vizinhos conquistaram recentemente a certificação como Área Livre de Febre Aftosa sem Vacinação, concedida pela Organização Mundial de Saúde Animal (OMSA) aos estados do Rio Grande do Sul, Paraná, Acre, Rondônia e partes do Amazonas e de Mato Grosso, mas ainda falta o reconhecimento da condição pelas autoridades sul-coreanas”, informou a Cidasc-SC.
Mustefaga detalha que a ABRAFRIGO participa das tratativas, mas que quem lidera as negociações é o MAPA, “e pelo que temos conhecimento, está avançando o acordo”. “O próprio ministro (Carlos Fávaro) já deu declarações recentemente à imprensa sobre isso, e o setor espera que isso se concretize. E vai representar uma quebra de paradigma também, porque é um mercado importante do ponto de vista econômico, paga bem, é muito exigente. Seria mais uma chancela para a qualidade da carne bovina do Brasil”, disse.
Para além da Coreia do Sul, o Japão também é elencado por Mustefaga como um dos top 3 mercados mais importantes no mundo para a carne bovina, e também extremamente exigente. Assim como a Coreia do Sul, o Japão apenas importa carne bovina de regiões livres de febre aftosa sem vacinação.
Segundo Douglas Coelho, sócio da Radar Investimentos, “estrategicamente falando, um país que paga bem é o Japão, que é um sonho, mas é um país rigorosíssimo”, diz. Ele explica ainda que a habilitação japonesa de frigoríficos brasileiros para exportação de carne bovina seria “carimbo, uma melhora na imagem do Brasil, algo que impactaria mais na reputação do que no volume embarcado em si”.
CHINA EM ROTA DE AUMENTO DE CONSUMO, MAS E O PREÇO?
“A China já é um grande parceiro que já estava consolidado e que é muito importante. O consumo per capita do Chinês ainda é baixo, mas vem numa constante de crescimento, e consolidar isso é de suma importância. Mas é importante lembrar que uma concentração muito grande causa uma dependência”, afirma Douglas Coelho.
No final do ano passado, delegações chinesas anunciaram visitas ao Brasil para vistorias em plantas frigoríficas de carne bovina em prospecção à novas habilitações. Segundo Paulo Mustefaga, no ano passado, foram 15 plantas que receberam auditoria de autoridades chinesas, e os resultados oficiais ainda não saíram. Neste ano, agora em janeiro, houve uma auditoria online, por vídeo, com 28 frigoríficos, perfazendo 43 indústrias no total que aguardam para serem habilitadas. Fora isso, outros 33 frigoríficos cujos questionários foram mandados para a China foram rejeitados pois havia alguma não-conformidade nos documentos, segundo o presidente executivo da ABRAFRIGO.
“Qualquer número (de frigoríficos) que seja aprovado, isso para o Brasil é bom, porque são mais empresas exportando, mais benefícios. Mas vale lembrar que a China não paga mais tão bem pela carne como era há dois ou três anos”, disse.
Mustefaga pontua que, em 2021, quando houve o boom de exportações de carne bovina para a China, o gigante asiático chegava a pagar cerca de US$ 7 mil dólares por tonelada da proteína, que caiu para US$ 6.385 em 2022 e US$ 4.761 em 2023. “A China passa por uma severa questão econômica, mas o volume embarcado acaba suplantando a questão do valor. Vale lembrar também que em 2021/22, com a alta nas exportações, a arroba do boi aqui era alta e o custo de produção também, mas agora o custo da matéria prima também baixou”, explica.
PERDA DE ESPAÇO NA UNIÃO EUROPEIA
Ao passo que o Brasil conquistou os mercados mais importantes no mundo para a venda de carne bovina, como China, Estados Unidos, México e Canadá, o país foi perdendo espaço na União Europeia, onde no início dos anos 2000 havia grande fatia das vendas.
Conforme explica Paulo Mustefaga, no início dos anos 2000 as exportações da proteína bovina brasileira para a União Europeia representavam quase 40%. Hoje o Brasil exporta o equivalente a 3,5% em volume e 5% em valor, por ser uma região que importa produtos com valor agregado maior.
“É preciso ponderar que conquistamos o mercado Chinês, que é 50% do que exportamos em volume. No caso da União Europeia, os problemas que vêm se acumulando são sobre questões restritivas que o próprio bloco coloca, como questões sanitárias de rebanho, o que não é justificável tecnicamente, porque o Brasil não tem problemas com nenhum outro mercado comprador”, afirma.
Para o presidente executivo da ABRAFRIGO, são barreiras muito ligadas ao protecionismo econômico, uma vez que o Brasil possui preços bastante competitivos. “Praticamente todo o país é livre de aftosa com vacinação e estamos avançando em estados livre da doença sem vacinação. E agora tem a questão das barreiras ambientais que a União Europeia aprovou sobre a rastreabilidade, questão de desmatamento. É preciso considerar que o Brasil tem leis ambientais rígidas”.
Mustefaga detalha que é difícil estimar o quanto uma retomada aos antigos patamares de exportações de carne bovina para a União Europeia representaria. “Mas é claro que se estivéssemos exportando para a União Europeia nos mesmos volumes do passado, nas condições normais de mercado, representaria uma oportunidade comercial excelente para o setor. No caso da União Europeia, são carnes de maior valor agregado, com maior preço”, apontou.
PARA ALÉM DA CARNE: EXPORTAÇÕES DE GADO EM PÉ
O balanço das exportações de gado vivo, ou ‘gado em pé’ de 2023 pelo Brasil ainda não foi finalizado, mas a perspectiva é de que tenha havido alta considerável em relação ao ano de 2022, segundo Ana Paula Oliveira. Médica veterinária e Zootecnista, mestre em Produção Animal pela FMVZ Unesp e analista de mercado da Scot Consultoria.
Ela explica que em 2022, o Brasil representava 3,78% da exportação mundial nesta modalidade, segundo o mais recente resultado do Departamento de Agricultura dos Estados Unidos (USDA, na sigla em inglês). “Em 2023 esse cenário deve mudar, apesar de não ter números oficiais, este número deve ter sido superado. Havia expectativa de 380 mil cabeças, e analisando o número geral, 2023 foram quase 600 mil cabeças. É um número que esperávamos ver somente na conclusão de 2024”, afirma a analista.
Este aumento das exportações de gado em pé pelo Brasil em 2023 deve, inclusive, desbancar alguns dos grandes players neste tipo de embarque, de acordo com Ana Paula. Em 2022, a União Europeia figurava em primeiro lugar, seguido de México, Canadá, Austrália, Estados Unidos e Brasil. “Em 2023 o Brasil deve chegar entre os três primeiros exportadores, deixando os Estados Unidos para trás, com menor rebanho no ano passado, e brigando com o Canadá e o México”, afirmou.
Um dos mercados-alvo do Brasil na exportação de gado vivo, segundo a especialista, é o Vietnã, que já está ‘aberto’ desde 2021, mas ainda sem negociações consistentes. A Turquia é um dos principais compradores do Brasil, e tem uma questão cultural dos abates, há uma exigência; em seguida vem o Egito e o Iraque. “O que vemos para o futuro próximo está mais relacionado ao aumento do volume comprado, como vemos acontecendo com o Egito, por exemplo”, explicou.
Sobre a rentabilidade, Ana Paula detalha que, se a análise das exportações de gado em pé for feita com foco na contribuição ao Produto Interno Bruto (PIB), o faturamento é pequeno: são US$ 500 milhões dólares ano, o que foi atingido em 2023. “A gente não consegue ver um número representativo como um todo, mas num pico de baixa de preço, por exemplo, quando exportamos esses bovinos, tem um retorno financeiro ao pecuarista muito mais rápido, o que melhora a condição de quem está vendendo”, explicou.
Entre os gargalos para este tipo de exportação para o ano de 2024, a analista elenca, além dos custos de produção para o gado, as questões logísticas. Os principais compradores do Brasil são do Oriente Médio, e hoje com estes conflitos armados, a analista afirma que é preciso fazer uma rota diferente, o que pode ser desafiador este ano. Podemos perder algum espaço para a Austrália pela questão da distância, para não passar pelo Mar Morto. Esse seria o principal desafio para o ano de 2024, a logística, para além dos custos com a alimentação dos animais por causa da quebra de safras de gãos”, finalizou.
Fonte: Notícias Agrícolas